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26/02/2002

Nova editora abre espaço para o haicai

Os haijins Ricardo Silvestrin e Alexandre Brito, de Porto Alegre, encontram-se nesta semana em São Paulo. O motivo da estada é fazer contatos com poetas, editores e entidades culturais paulistas, buscando viabilizar a fundação da mais nova editora do país, a AMEOP - ame o poema editora (no logotipo, o P de AMEOP está invertido, permitindo a leitura palidrômica que resulta na frase ame o poema).

Ricardo Silvestrin (esquerda) e Alexandre Brito, ladeando a poeta e haicaísta Alice Ruiz

Segundo Silvestrin e Brito, a AMEOP, sediada em Porto Alegre, será uma editora especializada em poesia, buscando trazer ao mercado o que existe de mais representativo na produção contemporânea nacional. Já está acertado o primeiro lançamento da editora: a coleção "Voz", com 10 títulos.

Quanto ao haicai, a AMEOP também tem grandes planos. Através do lançamento de uma coleção, também de 10 títulos, com autores ainda a definir, o que se pretende é rastrear e dar visibilidade a uma produção que vem evoluindo gradualmente a partir de discussões iniciadas nos primeiros Encontros Brasileiros de Haicai, na década de 80, e encontra-se hoje bem amadurecida, com muitos autores escrevendo haicais de boa qualidade em todos os cantos do país.

Em tempos de internet, o grande fórum do haicai brasileiro não está em jornais ou revistas literárias, mas num grupo eletrônico de discussões: a lista haikai-l. Ricardo Silvestrin sente-se gratificado por sua participação na lista, que ao permitir o confronto de diferentes tendências e linhas poéticas gerou reflexos, para melhor, em sua própria produção de haicais. Ademais, através da haikai-l, tem-se uma radiografia da produção de haicaístas de norte a sul do Brasil, independentes dos filtros a que deveriam se submeter para exposição na mídia cultural convencional, em larga escala dominada pelo que acontece no eixo Rio-SP.

Uma das propostas mais interessantes da AMEOP está em fazer com que suas edições sejam trilíngües, isto é, que tenham seus haicais publicados em português, inglês e japonês, como uma maneira de inseri-los no circuito internacional do haicai e mostrar ao mundo o que se faz no Brasil. O haicai hoje ultrapassou as fronteiras de seu país de origem para se tornar um meio corrente de expressão usado por poetas de todo o mundo, independentemente da nacionalidade sob a qual se abrigam. E à medida que o haicai se internacionaliza, cresce também o sentimento de uma comunidade mundial, unindo sob uma bandeira poetas de diferentes línguas em constante intercâmbio em torno da tradição do haicai.

Para Silvestrin, mesmo que, como poetas brasileiros de diferentes extratos, possamos escrever versos consideravelmente distantes dos cânones japoneses, ainda assim nos sentimos como participantes da tradição do haicai, pela afinidade com os valores estéticos propugnados por ela. É esse sentimento que alimenta a vontade de abrigar nossos versos sob a denominação de "haicai". Nesse sentido, Silvestrin prefere falar em "princípios" ao invés de "regras" para quem deseja escrever um haicai brasileiro. São de sua autoria os instigantes desmandamentos do haicai.

Quando se fala em internacionalização do haicai, inevitavelmente vem à baila o termo "globalização", desgastado pelas conotações negativas que lhe vem sendo atribuídas no campo econômico. As nacionalidades terão seu lugar na internacionalização do haicai, dentro da qual Silvestrin pretende inserir o haicai brasileiro? Para responder a essa questão, ele ecoa as palavras do prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, durante o último Fórum Mundial Social: que não é preciso temer a globalização, desde que se lute por uma inserção não subserviente do país no concerto mundial, atuando como sujeito da história e não a mero reboque das nações mais poderosas. Que se lute pela globalização dos sentimentos, das emoções e da beleza, significando que o mundo todo possa compartilhá-los.

Para fechar este relato, pedimos que Ricardo Silvestrin e Alexandre Brito nos deixassem alguns haicais:

triste fim da enguia
não vai pra mesa
nem volta pro mar

Ricardo Silvestrin

janela do trabalho
a tarde inteira na rua
o flamboyant

Ricardo Silvestrin

pequena abelha
deixa em mim
a sua dor

Alexandre Brito

livro antigo
o bicho traca
o sonho do sabio

Alexandre Brito

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